Enquanto cotação do leite UHT recua no atacado brasileiro, mercado global reage com alta no leite em pó. Margens do produtor seguem pressionadas, e o cenário para o segundo semestre ainda é incerto.
Cenário Nacional: Queda Acentuada no Leite UHT e Pressão no Varejo
Segundo a atualização quinzenal divulgada em 23 de abril de 2025 pelo MilkPoint Mercado, o preço do leite UHT no atacado voltou a cair em São Paulo, negociado agora a R$ 4,43 por litro, contra R$ 4,46 na última medição. A retração, embora leve, marca a terceira queda consecutiva no mês e reforça um movimento de acomodação de preços iniciado no final de fevereiro.
A pressão vem da retomada da produção nas principais bacias leiteiras do Sudeste, onde as condições climáticas favoreceram a recuperação das pastagens. Ao mesmo tempo, o consumo no varejo segue enfraquecido, em meio a um ambiente econômico de juros altos, endividamento das famílias e retração da demanda por produtos industrializados.
O impacto dessa equação é visível nas gôndolas: redes de supermercados vêm operando com margens apertadas e relatam aumento na substituição do leite UHT por derivados com maior durabilidade ou produtos de marca própria, mais acessíveis ao consumidor final.
Leite em Pó em Alta e Demanda Global em Recuperação
Na direção oposta, o mercado internacional apresentou sinais consistentes de recuperação. O leite em pó integral (WMP) teve alta de 2,8% na última quinzena, sendo cotado a US$ 4.171 por tonelada nos principais mercados asiáticos. A valorização é sustentada por uma demanda mais firme da China, Indonésia e Filipinas, que começam a recompor estoques após meses de importações reduzidas.
A oferta global também se contraiu. A produção da Nova Zelândia, principal player mundial, recuou 3,5% em março, afetada por clima adverso. Esse contexto internacional favorece indiretamente o Brasil, que pode ampliar sua participação nas exportações de lácteos industriais, especialmente leite em pó e queijos processados.
Margens do Produtor Brasileiro Seguem no Vermelho
Apesar do cenário externo mais animador, o produtor brasileiro enfrenta um contexto doméstico desafiador. Dados do Cepea indicam que a rentabilidade média do litro de leite caiu 6,2% em relação a abril de 2024. O custo com ração, responsável por mais de 50% dos gastos da atividade, continua em alta, puxado pela valorização do milho e do farelo de soja no mercado interno.
Além disso, a energia elétrica, essencial nos sistemas de ordenha mecanizada e refrigeração, teve reajustes acima da inflação em diversas regiões. Muitos produtores relatam dificuldade em fechar as contas mesmo com produtividade elevada, e o risco de saída da atividade cresce, especialmente entre pequenos criadores sem escala e acesso a crédito.
Políticas Públicas e Expectativas para o Segundo Semestre
O setor leiteiro tem pressionado o governo por medidas emergenciais. Entre as demandas prioritárias estão: a prorrogação de dívidas rurais, subsídios ao frete interestadual, fortalecimento do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e isenção tributária temporária para insumos estratégicos.
No Congresso, tramitam projetos que visam criar um fundo de estabilização para a cadeia do leite, inspirado em modelos adotados na Europa. No entanto, o avanço das propostas tem sido lento, e entidades como a CNA e a OCB alertam para a urgência da pauta.
Alívio Climático Pode Trazer Fôlego, Mas Não Resolve o Estrutural
As previsões meteorológicas indicam um inverno menos rigoroso em 2025, o que pode contribuir para a manutenção da produção nas regiões Sul e Sudeste. Ainda assim, especialistas concordam que a retomada do equilíbrio na cadeia depende de uma combinação de fatores: melhora no consumo interno, recuperação da capacidade de investimento e acesso a mercados externos com maior valor agregado.
Cadeia Leiteira em Encruzilhada Estratégica
O mercado do leite em abril de 2025 revela a fragilidade estrutural da cadeia produtiva nacional: excesso de oferta sazonal, queda na demanda doméstica e custo elevado de produção. Ao mesmo tempo, surgem oportunidades reais no mercado global — que só poderão ser aproveitadas com investimento em industrialização, sanidade, rastreabilidade e logística.
Se o Brasil deseja manter sua base produtiva e conquistar espaço internacional, será preciso mais do que resiliência do produtor: será necessária uma política nacional do leite que integre produção, consumo, exportação e inovação.
Fontes: MilkPoint, Cepea, Embrapa Gado de Leite, USDA, OCB, CNA, Valor Econômico