Estoque recorde de R$ 1,256 trilhão em títulos revela vigor econômico do agronegócio, mas também sinaliza riscos crescentes de endividamento e dependência de instrumentos financeiros sofisticados.
Boom do Financiamento: Uma Façanha Histórica
O agronegócio brasileiro alcançou em fevereiro de 2025 um marco histórico: o estoque total de títulos privados emitidos para financiamento do setor atingiu R$ 1,256 trilhão, segundo dados do MAPA e da B3. Esse valor representa um salto de 28% em relação ao mesmo período de 2024, consolidando o agro como um dos principais motores do mercado de capitais.
Os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e as Cédulas de Produto Rural (CPR) seguem como os instrumentos mais utilizados. Apenas os CRAs somam mais de R$ 90 bilhões em emissões acumuladas. Já as CPRs, responsáveis por boa parte do crédito rural, estão cada vez mais digitalizadas, permitindo maior rastreabilidade das operações.
Participação de Fundos e Investidores Institucionais Cresce
Fundos de investimento, seguradoras e fundos de pensão ampliaram expressivamente sua participação na carteira de títulos do agro. Essa sofisticação do perfil de investidores traz liquidez ao setor, mas também aumenta a dependência de expectativas macroeconômicas.
Apesar do crescimento expressivo do crédito privado, pequenos e médios produtores relatam dificuldades em acessar esses instrumentos. A burocracia, a exigência de garantias e o custo elevado dos serviços financeiros são entraves recorrentes, ampliando a desigualdade no campo.
Especialistas apontam que, embora o crescimento seja positivo, parte dele está ancorado em expectativas otimistas de produção e exportação. Uma quebra de safra severa ou instabilidades no comércio internacional podem gerar um efeito dominó, colocando em risco o pagamento de títulos e afetando a credibilidade do sistema.
Inovação Tecnológica Acelera Emissões
A digitalização de títulos como CPRs e CDCA (Cédula de Crédito do Agronegócio) tem facilitado o acesso e a emissão por cooperativas, agroindústrias e grandes fazendas. Plataformas integradas à B3 e ao Banco Central tornam o processo mais transparente, mas exigem maior letramento financeiro no campo.
Governo Fomenta Mercado com Isenção Fiscal
A manutenção dos benefícios fiscais para títulos do agro, como a isenção de imposto de renda sobre os rendimentos dos CRAs, tem sido um dos principais impulsionadores da demanda. Essa política, porém, é criticada por economistas que defendem uma revisão na distribuição de incentivos.
Com eventos extremos cada vez mais frequentes, instituições financeiras começam a incluir cláusulas de risco climático nas avaliações de crédito. Modelos preditivos já são usados para calcular a chance de inadimplência vinculada a estiagens, enchentes e pragas.
Endividamento Rural Preocupa Setor
Embora os níveis de inadimplência estejam sob controle, o endividamento geral do setor agrícola cresce a taxas superiores à média nacional. Produtores que operam com margens estreitas podem ser mais vulneráveis a choques externos ou queda nos preços das commodities.
O foco em sustentabilidade tem ampliado a participação de investidores com perfil ESG. Títulos verdes lastreados em projetos agroecológicos e de baixa emissão de carbono ganham visibilidade, mas ainda representam parcela pequena do total emitido.
A crescente complexidade do mercado de títulos do agro exige regulações mais robustas. A CVM e o Banco Central estudam medidas para ampliar a transparência, prevenir riscos sistêmicos e garantir a solvência das operações.
Crescimento Sustentado ou Excesso de Confiança?
O recorde de R$ 1,256 trilhão em títulos privados evidencia a força financeira do agronegócio em 2025, mas também expõe fragilidades estruturais. O desafio agora é garantir que o crédito seja acessível, transparente e resiliente frente às incertezas econômicas e climáticas do país.
Fontes: MAPA, B3, Banco Central, CVM, CNA, ABAG, Valor Econômico, Estadão Agro, Canal Rural, Globo Rural, Insper, XP Investimentos, Rabobank, Observatório das Finanças Verdes