Com escalada de tarifas entre Washington e Pequim, blocos comerciais se realinham. UE tenta preservar autonomia, mas enfrenta dilemas econômicos, tecnológicos e diplomáticos que desafiam sua coesão.
Bruxelas em Dilema Estratégico: Neutralidade ou Alinhamento com Washington?
A União Europeia vive seu maior impasse estratégico desde o Brexit. Com a escalada tarifária entre Estados Unidos e China — que já alcança 245% em produtos-chave —, o bloco europeu se vê forçado a rever sua posição no tabuleiro global.
Em pronunciamento oficial na tarde de 22 de abril, Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, afirmou que “a Europa está comprometida com a ordem comercial multilateral”, mas reconheceu que “será necessário repensar os instrumentos defensivos do mercado europeu diante da crescente fragmentação global”.
Pressões Americanas: Chips, Veículos Elétricos e Conformidade Política
Fontes em Bruxelas confirmam que os EUA pressionam países europeus a aderirem a barreiras sincronizadas contra produtos chineses em setores considerados sensíveis, como semicondutores, veículos elétricos e tecnologias verdes. Em troca, Washington acena com acesso privilegiado ao mercado financeiro americano e prioridade nas parcerias militares da OTAN.
Alemanha e Países Baixos mostram-se inclinados a seguir os EUA, temendo represálias no setor automobilístico e a perda de protagonismo industrial. Já França, Espanha e Hungria defendem uma “via europeia”, menos subordinada ao interesse estratégico americano.
China Sinaliza Retaliação Diplomática e Comercial à UE
Em resposta às movimentações europeias, Pequim advertiu que poderá reavaliar os acordos de importação de vinhos, aviões, cosméticos e produtos agrícolas vindos da Europa. Segundo o porta-voz do Ministério do Comércio da China, “qualquer alinhamento passivo da Europa às políticas protecionistas dos EUA será interpretado como hostilidade econômica”.
Além disso, Pequim ameaça suspender projetos conjuntos de infraestrutura com países da Iniciativa do Cinturão e Rota (Nova Rota da Seda), afetando diretamente investimentos em Grécia, Portugal, Itália e países do Bálcãs.
Indústria Europeia Sofre com Pressão Dupla: Custo e Competição
A indústria europeia enfrenta uma tempestade perfeita: encarecimento de matérias-primas, alta de energia, perda de competitividade frente à Ásia e dificuldade de acesso ao crédito. O setor de baterias elétricas já registra queda de 14% nos investimentos em 2025, e fábricas na Bélgica e Eslováquia anunciam demissões em massa.
O Banco Central Europeu projeta crescimento de apenas 0,7% no bloco neste ano, com inflação persistente acima de 4,3%. Agricultores franceses e espanhóis protestam contra a entrada de produtos chineses subsidiados, que desestabilizam os preços domésticos.
União Europeia Debate Nova Doutrina Comercial Autônoma
Em resposta às pressões externas, começa a tomar corpo em Bruxelas a ideia de uma “Doutrina Comercial Europeia”, nos moldes do que os EUA e a China já implementam. A proposta inclui:
- Criação de um fundo de transição industrial verde;
- Regras de compras públicas que privilegiem fornecedores do bloco;
- Tarifas temporárias contra produtos importados com pegada ambiental elevada;
- Acordos bilaterais com América Latina e África para diversificar fontes de suprimento.
Europa em Crise de Identidade Estratégica
O avanço da guerra econômica global expõe o vácuo de estratégia da União Europeia, que precisa escolher entre alinhamento funcional com os EUA ou construção de uma rota autônoma arriscada. Em meio a esse impasse, cresce o risco da irrelevância — política, econômica e tecnológica.
A resposta europeia ao novo mundo multipolar será decisiva para o futuro do bloco. Ou a UE redefine seu papel global com assertividade e coesão, ou será condenada a assistir à disputa entre potências como espectadora de luxo.
Fontes: Comissão Europeia, Deutsche Welle, Politico Europe, South China Morning Post, Le Monde, Reuters, Financial Times
